A manutenção do Exame da OAB é essencial ao
país
A Constituição
Federal dispõe no seu artigo 5º Inciso XIII, que “é livre o
exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer”.
A liberdade de
exercício do trabalho, na maioria dos países, em especial nos mais
desenvolvidos, é limitada às pessoas qualificadas para isso. De um lado,
preserva-se a possibilidade de acesso a toda e qualquer profissão, garantia
constitucional ligada ao direito de trabalhar, de outro, as regras que
delimitam a eficácia da norma constitucional, e visam à proteção ao público,
impondo a aferição das qualificações profissionais.
No Direito, como
Medicina, as faculdades (ou universidades) ensinam a disciplina, e depois, em
cursos ou outro modo, aprende-se a profissão.
No Reino Unido, ao
terminar um curso de Direito, o estudante pode escolher entre preparar-se para
ser um Barrister ou um Solicitor. Precisa fazer um curso e submeter-se a um
exame, mesmo que tenha concluído uma faculdade.
O mesmo ocorre na
França e na Alemanha. Em Portugal, a Corte Constitucional impôs que o exame
fosse estabelecido por lei. Nos Estados Unidos, não somente há a exigência do
Exame de Ordem, como a do aperfeiçoamento constante dos advogados como condição
para exercício da profissão.
Na Espanha, a lei
34/2006 regula o acesso à profissão de advogado, impondo o ensino e aferição do
aprendizado. E na Itália, há uma avaliação, similar ao Exame de Ordem, que deve
ser feito pelos que tenham um diploma de Direito, após um estágio de, no
mínimo, dois anos, nos quais devem ter feito mais de 20 audiências, escrito
quatro relatórios, entre outros requisitos. No Japão também se exige o Exame de
Ordem e há pouco se aumentou o nível de exigência do mesmo.
Assim, por toda
parte há uma clara distinção entre o diploma e a qualificação profissional. No
Brasil, muito adequadamente, o Exame é exigido no artigo 8º, IV, da Lei 8.906,
de 1994 e como ocorre nos países citados e, em muitos outros, para fazer o
Exame de Ordem é preciso ter estudado Direito.
Contra a existência
desse requisito legal, perfeitamente constitucional, ergueram-se vozes de
candidatos fracassados nos Exames e dos grandes interessados econômicos.
Tratam-se das numerosas faculdades privadas, que muitas vezes não cumprem o
dever de ministrar um ensino eficiente de Direito, e, ao invés, se concentram
com vigor na cobrança de anuidades e outras taxas.
É em auxilio à
falácia propalada por esses interessados que um sub-procurador federal opinou
que “o diploma é, por excelência, o comprovante de habilitação que se exige
para o exercício das profissões liberais. O bacharel em Direito, após a
conclusão do curso, deverá, ao menos em tese, estar preparado para o exercício
da advocacia e o título de bacharel atesta tal condição”. Diz mais, que “não se
pode admitir seja o Exame de Ordem instrumento de seleção dos melhores
advogados (critério meritório). Se assim considerado, mais flagrante se tornam
a indevida restrição à escolha profissional e o caminho para intolerável
reserva de mercado”.
A afirmação de que
o diploma de Bacharel é um comprovante de aptitude para o exercício da
profissão de advogado não corresponde à realidade. A Constituição não diz que é
livre o exercício de qualquer profissão a quem tenha um diploma.
Ela diz claramente
que o exercício dessa liberdade é condicionado ao preenchimento dos requisitos
da lei para proteger o interesse público.Como em todo o mundo civilizado,
hoje as faculdades dão apenas um certificado de que uma pessoa concluiu seu
curso de Direito.
O exercício da
profissão de advogado – que segundo a Constituição é indispensável à administração
da Justiça – pode, pela lei, estar sujeito a um exame que comprove a
possibilidade de prestar serviços ao público. O argumento da “intolerável
reserva de mercado,” despido de qualquer valor jurídico, não se sustenta porque
a Ordem não seleciona os melhores advogados nem limita o acesso à profissão.
Ela examina os bacharéis para saber se eles têm as qualificações necessárias
para serem advogados, ou seja, para exercer a profissão.
A experiência
mostra é que a maioria dos que tem um diploma não o merecia, e nem tem a
qualificação necessária para o exercício de uma profissão que deve servir para
proteger os cidadãos e garantir-lhes direitos fundamentais. Trata-se do que
Bobbio chama de função promocional do Direito. O interesse público por
essa promoção aparece em outras normas, como as do artigo 4º da lei 8904/94, e
do artigo 307 do Código Penal.
A exigência de uma
qualificação adequada em serviços de utilidade pública não existe para criar
uma “reserva de mercado”, mas isto sim para proteger o público, em especial as
pessoas de menores recursos da incompetência e da ignorância de alguns
bacharéis. Causa, assim, certa preocupação que num momento em que se
deveria discutir reformas no ensino jurídico para aprofundamento das habilidades
relevantes à profissão, seja aventada a possibilidade de retrocesso,
transferindo à sociedade o ônus de realizar a primeira triagem daqueles que hão
de defender seus mais caros interesses.
Luiz
Olavo Baptista é fundador do escritório L.O. Baptista e atua em societário,
arbitragem nacional e internacional
Revista Consultor
Jurídico, 14 de agosto de 2011
“Parecer
contra Exame de Ordem é retaliação”
Integrante do
Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o advogado Almino Afonso
Fernandes afirmou, nesta quinta-feira (21/7), que o parecer contrário (download
do parecer) ao Exame de Ordem emitido pelo subprocurador-geral da República
Rodrigo Janot é “uma retaliação” à Ordem dos Advogados do Brasil. O motivo, de
acordo com o conselheiro, foram os dois votos que os representantes da Ordem no
CNMP deram pela abertura de processo disciplinar contra Janot, há pouco mais de
um mês.
Rodrigo Janot foi
alvo de representação no CNMP sob acusação de inércia ou excesso de prazo para
emitir justamente o parecer no recurso que contesta a constitucionalidade do Exame
de Ordem no Supremo Tribunal Federal. Apenas os conselheiros Almino Afonso e
Adilson Gurgel, indicados pela OAB, votaram pela abertura de processo
administrativo disciplinar contra o subprocurador. Por isso, a representação
foi arquivada (clique aqui
para ler a decisão).
O recurso que
questiona a constitucionalidade do Exame de Ordem foi protocolado no STF em 1º
de outubro de 2009. No dia 11 de dezembro do mesmo ano o tribunal reconheceu a
repercussão geral da matéria. Ou seja, admitiu seu julgamento. Em 21 de maio de
2010, o ministro Marco Aurélio, relator do processo, determinou o envio do caso
para a Procuradoria-Geral da República, para a emissão de parecer.
O processo foi
distribuído ao subprocurador-geral Rodrigo Janot em 27 de maio de 2010. O
parecer foi emitido na última terça-feira (19/7). Quando o recurso completou um
ano no gabinete de Janot sem o parecer, o subprocurador foi alvo de
representação por inércia no CNMP. O relator do pedido de abertura de processo
disciplinar contra Janot foi o conselheiro Almino Afonso.
“No voto, eu
registrei a impertinência da demora e afirmei que o subprocurador claudicou.
Portanto, deveria responder a processo administrativo disciplinar por ter
deixado engavetado por mais de um ano o recurso à espera de seu parecer”,
afirmou Afonso à revista Consultor Jurídico. “A leitura que eu faço do
parecer é de uma evidente retaliação à posição que eu e meu colega assumimos no
CNMP. O que é mais lamentável é que, mesmo passado mais um ano, o eminente
subprocurador emitiu parecer contrário à própria Constituição Federal”,
concluiu o advogado.
A representação
contra Janot foi julgada em 14 de junho passado. Venceu a divergência aberta
pelo conselheiro Mário Bonsaglia, para quem não houve inércia do subprocurador
na análise da matéria e o excesso de prazo foi justificado. Em seu voto,
Bonsaglia, que é procurador regional da República, registrou que nos primeiros
cinco meses de 2011, Rodrigo Janot movimentou mais de dois mil processos, entre
judiciais e extrajudiciais.
Bonsaglia explicou
que o subprocurador acumula as atribuições de coordenador da 5ª Câmara de
Coordenação e Revisão do MPF e de membro do Conselho Superior da instituição.
Também sustentou que a complexidade da discussão em torno do Exame de Ordem
contribui para justificar o excesso de prazo. A maioria dos membros do CNMP
concordou com procurador regional e a representação foi arquivada.
Mas o relator do
caso, Almino Afonso, afirmou em seu voto que não havia “nenhuma relevância” no
fato de o subprocurador-geral da República Rodrigo Janot acumular funções no
Ministério Público Federal. Isso porque “foi galgado a tais cargos por opção
própria, pessoal, e quando escolheu compor tais órgãos sabia que não seria com
prejuízo de sua atividade fim”. Para Afonso, a jurisprudência do CNMP é
“tranquila no sentido de que a retenção de autos pelo prazo de um ano configura
falta funcional”.
O conselheiro Almino
Afonso julgou inadmissível a demora: “Não é crível admitir que seja necessário
mais de um ano para realizar estudos e pesquisas para firmar seu convencimento,
pois quando o cidadão bate às portas da Justiça busca uma resposta estatal
dentro de razoável lapso temporal, e não visa que seu processo seja objeto de
tratados”. Apenas o conselheiro Adilson Gurgel concordou com Afonso.
Para o advogado que
relatou a representação contra Janot, seu voto foi o motivo determinante para
que ele desse parecer contrário ao Exame de Ordem. A ConJur procurou
ouvir o subprocurador por meio da assessoria de imprensa da Procuradoria-Geral
da República, mas Janot não pôde responder ao pedido de entrevista até a
publicação deste texto.
De acordo com o
parecer de Rodrigo Janot, a exigência de aprovação no Exame de Ordem para que o
bacharel em Direito possa se tornar advogado e exercer a profissão fere o
direito fundamental à liberdade de trabalho, consagrado pela Constituição
Federal de 1988. Para ele o Exame de Ordem cria uma restrição ilegal de acesso
à profissão de advogado.
“O diploma é, por
excelência, o comprovante de habilitação que se exige para o exercício das
profissões liberais. O bacharel em Direito, após a conclusão do curso deverá,
ao menos em tese, estar preparado para o exercício da advocacia e o título de
bacharel atesta tal condição”, escreve o subprocurador-geral da República.
O presidente em
exercício do Conselho Federal da OAB, Alberto de Paula Machado, afirmou que a
opinião de Janot é
isolada dentro do Ministério Público Federal porque a instituição já se
manifestou diversas vezes favorável ao Exame de Ordem. Machado também criticou
o parecer e disse que suas premissas são equivocadas.
Rodrigo
Haidar é correspondente da revista Consultor Jurídico em
Brasília.
Revista Consultor
Jurídico, 21 de julho de 2011
O EXAME DE ORDEM EM PORTUGAL (inconstitucionalidade)
Brasília, 25/01/2011 - O artigo "O Exame de
Ordem em Portugal" foi publicado hoje (25) no site Consultor Jurídico e é
de autoria do secretário-geral do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coêlho:
"Diferentemente
do caso brasileiro, o Exame de Ordem em Portugal não é previsto em lei tendo
sido criado por resolução da entidade da advocacia portuguesa, sendo este o
motivo para a declaração de inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional dos
patrícios (download
da decisão do Tribunal Constitucional Português). No Brasil, o exame é
previsto e exigido no art. 8º., IV, da Lei 8.906, de 1994, segundo a qual
"para inscrição como advogado é necessário aprovação em Exame de
Ordem".
No acórdão n.º
3/2011, referente ao processo n.º 561/10, julgado pela 2.ª Secção do Tribunal
de Portugal, sob a relatoria do Conselheiro João Cura Mariano, encontra-se
registrado: "o artigo 9.º-A do Regulamento Nacional de Estágio da Ordem
dos Advogados, aditado pela Deliberação n.º 3333-A/2009, de 16 de Dezembro, do
Conselho Geral da Ordem dos Advogados, criou um novo exame nacional de acesso
ao estágio".
Ao contrário do
Estatuto da Advocacia brasileira, lei 8906/94, que exige o exame de Ordem, o
Estatuto Português, no seu artigo 187.º, determina que "podem requerer a
sua inscrição como advogados estagiários os licenciados em Direito por cursos
universitários nacionais ou estrangeiros oficialmente reconhecidos ou
equiparados". A introdução do exame sem modificação na lei resultou na
declaração de inconstitucionalidade. Ressalta o relator da matéria: "Não
cabe aqui discutir o eventual mérito das razões invocadas pela Ordem para a
introdução do exame de acesso ao estágio em si mesmo e nos termos em que o
fez". Ocorreu, no caso português, violação da reserva de lei.
Cumpre firmar que a
Constituição de Portugal, tal qual a brasileira, assegura a liberdade
profissional, permitindo sua restrição apenas por lei. Dispõe o artigo 47.º,
n.º 1, da Constituição Portuguesa, em redação semelhante ao art, 5º., XIII, da
Constituição brasileira: "todos têm o direito de escolher livremente a
profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo
interesse colectivo ou inerentes à sua própria capacidade".
O Acórdão da Corte
Constitucional portuguesa torna evidente, "A liberdade de escolha de
profissão faz parte do elenco dos direitos, liberdades e garantias cuja
restrição só pode, nos termos do artigo 18.º, n.ºs 2 e 3, do texto
constitucional, ser operada por via de lei formal, isto é, lei da Assembléia da
República ou decreto-lei do Governo". Neste particular, Portugal acaba por
se posicionar pela perfeita constitucionalidade do exame em hipótese, como a
brasileira, na qual existe previsão legal.
Comentando a
Constituição de Portugal, no ponto em apreço, anota Jorge Miranda e Rui
Medeiros (Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra 2005, p. 476): "As
restrições têm de ser legais, não podem ser instituídas por via regulamentária
ou por acto administrativo". No mesmo toar, Gomes Canotilho e Vital
Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, I, Coimbra 2007, p.
658): "as ordens profissionais e figuras afins ("câmaras
profissionais", etc.) não podem estabelecer autonomamente restrições ao
exercício profissional - as quais só podem ser definidas por lei (reserva de
lei)".
O julgamento pela
inconstitucionalidade do exame de acesso a advocacia em Portugal, ao contrário
do que poderia parecer a uma leitura apressada, significa um precedente
positivo do direito comparado ao exame de ordem brasileiro. É dizer, a Corte
Constitucional de Portugal asseverou que tal exame pode ser criado por lei, tal
qual ocorre no caso brasileiro".