Por Rogerio Neiva em 24 de maio de 2011
Recentemente, ao
iniciar a minha primeira aula de um curso voltado à preparação para o Exame da
OAB, vendo rostos angustiados e assustados com o clima quase que de terror em
torno do referido exame, me vi obrigado a levantar a pergunta indicada no
título do texto, para em seguida trabalhar a resposta. Daí indaguei aos
alunos: apenas assistindo as aulas é viável passar na prova?
Muito bem,
considero que a resposta exige a reflexão de aspectos empíricos, bem como da
mobilização de construções e conceitos de caráter mais técnico e científico,
estabelecidos no âmbito das ciências voltadas ao estudo da aprendizagem.
Neste sentido,
primeiramente é preciso entender que o objetivo de todos os candidatos
envolve a apropriação e disponibilidade intelectual de informações no momento
da prova. E o que isto significa, em termos cognitivos? Significa, a
rigor, a capacidade de registrar e evocar informações. E apenas
assistir a aula irá garantir esta condição? Talvez em
relação a algumas informações sim, mas não em relação a todas.
A grande questão é
que, em tese, salvo melhor juízo e sem a pretensão do monopólio da verdade
absoluta – até por amor à ciência que rejeita verdades universais, absolutas e
eternas, entendo que, definitivamente, não seria possível contar com a
suficiente disponibilidade intelectual do conjunto de informações e
conhecimentos apenas assistindo aulas! Ou seja, considero que apenas
as aulas não vão garantir a necessária evocação das informações exigidas pelo
examinador. E porque tenho esta compreensão?
A memória
consiste numa função cognitiva complexa, influenciada por diversos fatores, de
natureza neurofisológicos, emocionais, comportamentais e cognitivos. O momento
em que se teve o contato com determinada informação, a forma como o professor a
colocou e mesmo as condições fisiológicas do candidato naquele momento (por exemplo o estado de alerta e o sono)
podem influenciar.
Portanto, assistir
as aulas tende a não ser suficiente, inclusive ante a necessidade de reiteração
de contato com o objeto de conhecimento trabalhado na sala de aula. Há
uma unanimidade na neurociência e demais campos do conhecimento que trabalham
com a memória, no sentido da compreensão de que o cérebro funciona com
uma lógica de que o que é tido por relevante é mantido e o irrelevante é
descartado. E aquilo que é visto de forma reiterada passa a ser tido relevante.
Segundo matéria
publicada recentemente na Revista Mente e Cérebro, “…quando
lembramos algo, determinadas vias neurais serão reativadas. Quanto
mais vezes isso acontece, mais importante o cérebro considera a recordação e é
mais provável que ela seja convertida numa memória de longo prazo,
com a formação de conexões permanentes entre os neurônios. Essas conexões são
reforçadas cada vez que a informação é retomada, facilitando sua recuperação.”
(Marshall, Jéssica. “Esquecer para lembrar”, no. 27, 2011, p. 48).
Inclusive, sobre o
tema, vale sugerir a leitura lembrar o texto publicado aqui no Blog sobre Memória
Associativa e Preparação para Concursos (clique
aqui para ler).
Além da
importância da reiteração do contato, voltada a estimular a memória enquanto
capacidade de evocação da informação, também é importante que o objeto
de conhecimento com o qual se teve contato na aula seja trabalhado por meio de
outros processos cognitivos, em momentos distintos.
Segundo o modelo
de aprendizagem proposto pelo neuropsicopedagogo Victor da Fonseca, o
referido processo tem como etapas o input (contato com a
informação), cognição (compreensão da informação), output
(exteriorização da informação) e retroalimentação, a
qual envolve a reiteração de contato (“Cognição, neuropsicologia e
aprendizagem”. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 154). Adotando abordagem
semelhante, para Reuven Feustein, romeno com atuação em Israel
e uma das maiores autoridades atualmente no tema da aprendizagem, autor da Teoria
da Modificabilidade Cognitiva Estrutural, o processo de aprender
conta com uma fase de entrada, elaboração e saída (Souza, Ana Maria,
Depresbiteris, Lea e Machado, Osny Telles. “A mediação como princípio
educacional. Senac, p. 74).
Estas construções
podem nos levar à idéia de que, por diversos motivos, como por exemplo a
dinâmica da aula, a fase de elaboração ou cognição no referido contexto
de aprendizagem pode contar com algumas limitações em determinados momentos e
quanto a determinados assuntos. E esta compreensão exigirá a adoção de outros
processos cognitivos em outros momentos.
Conforme sustento
no livro que escrevi sobre o tema da preparação para concursos públicos (“Como
se preparar para concursos com alto rendimento”, ed Método), o
planejamento de estudos deve ser estruturado em duas etapas, sendo uma
voltada ao que denomino de apropriação cognitiva primária e
outra correspondente à apropriação secundária.
A primeira envolve o contato inicial com o objeto de conhecimento a ser
intelectualmente apropriado, ao passo que a segunda é voltada à manutenção,
reiteração e aperfeiçoamento deste mesmo objeto cognitivo.
As aulas
consistem em modalidade de estudo que podem ser adotadas em qualquer das duas
etapas. Mas o fato é que considero relevante a reiteração do contato com a
informação, bem como a adoção de distintos processos cognitivos.
Outro aspecto
importante consiste na preocupação com o estilo de aprendizagem de cada
candidato, tema abordado no texto Preparação
para Concurso e Estilos de Aprendizagem (clique
aqui para ler). Isto é, as aulas não terão o mesmo
efeito para todos os alunos, considerando a pluralidade de estilos, o
que decorre de uma enorme multiplicidade de fatores, desde culturais aos
orgânicos e neurofisiológicos.
Portanto, apesar
da relevância e do papel que as aulas podem exercer ao longo da preparação para
concursos e exames, em regra, é preciso agregar outros esforços em termos de estudos.
A preocupação fundamental é que você não se iluda, imaginando que ao se
matricular em um curso preparatório e apenas assistindo as aulas terá sua
aprovação garantida. E assim, procure se organizar, de modo a otimizar
seu tempo e viabilizar condições de adotar outras formas de estudo.
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